Uma passada rápida para tirar um pouco das teias que tem no blog:

Como bom executivo de uma empresa que vende software antivírus, o russo Eugene Kaspersky, 46, oferece conjecturas sombrias para o universo da cibersegurança.

Ao longo da entrevista que deu à Folha por telefone, usou dez vezes a palavra “infelizmente” (“infelizmente, a situação está piorando”, “infelizmente, o Brasil é uma das maiores fontes de cibercrime”, “infelizmente, redes sociais estão sendo ocupadas por cibercriminosos”).

Kaspersky estará no Brasil em novembro, mas a empresa ainda não divulgou sua agenda no país.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.

Folha – Qual é a situação do Brasil no cenário de cibersegurança?

Eugene Kaspersky – Infelizmente, o Brasil é uma das maiores fontes de cibercrime. Atualmente, a maior fonte de malware e ataques ainda é a China, mas países de línguas portuguesa e espanhola vêm logo atrás.

Quais dos últimos incidentes de cibersegurança você considera mais graves?

Foram vários. Neste ano, muitas empresas grandes foram atacadas, não só por cibercriminosos como também por software espião desenvolvido por outros países.

Um dos maiores incidentes foi no mês passado, com a Mitsubishi, no Japão. A empresa, que é uma das maiores fornecedoras militares do país, foi vítima de um ataque muito sério. Muitos dados confidenciais e ultrassecretos podem ter caído em mãos erradas.

Houve ainda, no ano passado, o Stuxnet, que atacou instalações nucleares do Irã.

Os ataques mais graves estão mirando empresas, forças armadas e governos. Temo que, no futuro, veremos mais ameaças a parques industriais, usinas de energia e sistemas de transporte.

Como você convence as pessoas a pagar por antivírus, já que há tantas alternativas gratuitas?

Usuários de antivírus gratuitos serão infectados mais cedo ou mais tarde. Esses produtos não garantem a mesma qualidade de proteção dos pagos.

Ouvi um comentário muito engraçado de um “geek”, uma pessoa que entende o que faz com o computador.

Ele disse: “Sou um expert, sei o que faço, conheço os sites que visito e sou capaz de consertar meu computador. Uso antivírus gratuitos porque eles são bons o suficiente para mim. Mas para proteger o computador da minha namorada, da minha mãe e do meu pai, é melhor usar um antivírus pago”.

Você já disse que nunca contrataria um hacker. Por quê?

Em primeiro lugar, porque não precisamos desses caras. É muito mais difícil desenvolver proteção do que atacar. Precisamos de pessoas que tenham um conhecimento muito maior e que sejam mais profissionais do que os hackers geralmente são.

Em segundo lugar, se a pessoa agiu de forma errada no passado, há um risco muito grande de que volte a fazer isso no futuro.

Então, não, obrigado. Não há empregos para hackers, criminosos e crackers na minha empresa.

Desde que você se tornou um executivo, nunca mais voltou a escrever código?

Não escrevo código há uns quatro, cinco anos, infelizmente. Exceto uma vez em que estávamos na Antártida, tivemos problemas com a conexão de internet, e eu tive que escrever uma ferramenta bem rudimentar para ajudar o sistema a se manter conectado à rede.

Em uma entrevista à “Der Spiegel” em junho, você disse que seu computador quase havia sido infectado duas vezes recentemente. De lá para cá, aconteceu de novo?

Foi no ano passado, em um hotel. A página do hotel estava infectada, e não havia nenhuma possibilidade de se conectar à internet sem passar por ela. Mas meu antivírus me protegeu (risos). Eu não baixo arquivos ilegais e sou bastante cuidadoso ao visitar sites. Estou numa zona segura, mas, é claro, estou sempre munido de software de proteção.

FILHO FOI SEQUESTRADO EM ABRIL

Nascido na cidade russa de Novorossiysk em 4 de outubro de 1965, Eugene Kaspersky se formou em 1987 pelo Instituto de Criptografia, Telecomunicações e Ciência da Computação.

Ele começou a estudar vírus de computador em 1989, depois da disseminação do Cascade, primeiro vírus a utilizar criptografia (codificação de dados) para dificultar sua detecção.

Entre 1991 e 1997, Kaspersky trabalhou no centro de tecnologias da informação Kami, onde criou o antivírus AVP, que foi renomeado para Kaspersky Anti-Virus em novembro de 2001.

Em 1997, ele cofundou a Kaspersky Lab com sua então mulher, Natalia Kaspersky. Foi líder de desenvolvimento de tecnologia da empresa por dez anos, até se tornar executivo-chefe, em 2007.

Em abril, seu filho Ivan, então com 20 anos, foi sequestrado por uma gangue russa e libertado poucos dias depois pela polícia.

“Meu filho teve parte da culpa por seu sequestro. Ele havia compartilhado seu endereço no Facebook, mesmo depois de eu ter passado anos alertando-o para não revelar nenhuma informação pessoal na internet”, afirmou Kaspersky à “Der Spiegel” em junho.

Questionado pela Folha sobre o assunto, Kaspersky preferiu não se manifestar. “É um assunto muito pessoal”, alegou.

Fonte: Folha.com